Abreu, Jaime (1912)
ABREU, Jaime d’ (1912). Julgamento de Um Jornalista no Tribunal Marcial de Cabeceiras de Basto.
Autor: D’ ABREU, Jaime [ABREU, Jaime Rodolfo de Carvalho]
Ano de elaboração (caso não coincida com ano de publicação)
Ano de publicação/impressão: 1912
Título completo da obra: Julgamento d’um jornalista no Tribunal Marcial de Cabeceiras de Basto
Tema PRINCIPAL: Liberdade de Imprensa
Local de edição: Braga
Tipografia: Imprensa Henriquina a Vapor - Braga - 1912
Número de páginas: 44
Cota na Biblioteca Nacional e noutras bibliotecas públicas
Cota da Biblioteca Nacional: S.C.-6962//1-V
Cota da Biblioteca Pública Municipal do Porto: L3-3-133 (17)
Esboço biográfico do autor
Jaime Rodolfo de Carvalho Abreu nasceu a 16 de Fevereiro de 1869, na freguesia de Refojos, no concelho de Cabeceiras de Basto, e faleceu a 15 de Março de 1935. Licenciou-se em Direito em 20 de Junho de 1895, foi advogado, jornalista, primeiro administrador e presidente da primeira comissão republicana de Vieira do Minho, em 1910. Foi director do jornal Notícias de Vieira e director, proprietário e editor do jornal Povo de Vieira.
Índice da obra
[Não tem índice]
Explicação prévia: p. 4
Leitura da acusação: pp. 5-7
Interrogatório: pp. 7-16
Inquirição de testemunhas: pp. 16-20
Debates: pp. 20-23
Quesitos: pp. 23-24
Sentença: pp. 24-25
Recurso: p. 26
Exposição ao Presidente da República: pp. 27-28
Apensos: p. 29
Suplemento ao nº. 37 do “Povo de Vieira”: p. 30
Apreciações da Imprensa: pp. 31-38
Pareceres: pp. 39-44
Resumo da obra
Esta obra trata do julgamento do advogado e jornalista Jaime Rodolfo de Carvalho Abreu, no dia 3 de Setembro de 1912 (quase dois anos após a implantação da República), no Tribunal Marcial de Cabeceiras de Basto e está redigida de acordo com a terminologia da época, a qual iremos respeitar na medida do possível.
Numa “explicação prévia”, Jaime d’ Abreu assume que irá relatar o seu julgamento, “abstendo-se de comentar ou fazer a mínima apreciação”, optando por “uma narrativa fiel” e “nada mais”. Uma narrativa feita na primeira pessoa.
De acordo com o respectivo libelo, Jaime d’ Abreu foi “culpável de incitar o cometimento do crime previsto no art. 1º. da lei de 30 d’abril do corrente ano, com a publicação de um artigo, de que é autor, inserto no nº. 37 de Julho (1912) do jornal Povo de Vieira e que tem por epígrafe “Tudo por culpa do atual regime”, jornal este de que se acha junto um exemplar a fl. 3, e de que o réo é diretor, proprietário e editor, cometendo o mesmo réo, com este artigo, o crime previsto e punido pelo art. 3º. Da citada lei de 30 d’ abril do corrente ano.”
Lida a acusação, o advogado de defesa, dr. Manuel Sá Couto, pediu a palavra para “deduzir a excéção de incompetência do tribunal militar, visto faltar absolutamente base d’acusação pelo crime de incitamento de que trata o artigo 3º. da Lei de 30 d’ Abril; e de não haver possibilidade de tal incitamento, decorridos os acontecimentos revolucionários que a referida lei teve por fim reprimir, e serem permitidos quaisquer meios de discussão ou crítica, segundo o regime de Imprensa em vigor”.
A dedução de excepção foi indeferida pelo tribunal e o advogado de defesa manifestou o seu protesto, dizendo que iria recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça. De seguida, Manuel Sá Couto dita os artigos da contestação, alegando “não haver corpo de delito, muito menos fundamento d’ acusação; não poder o artigo incriminado considerar-se incitamento a qualquér dos crimes de que fás menção o artigo 1º. Da Lei de 30 d’ Abril, quér pela interpretação isolada d’aquele artigo, quér pela subordinação á série d’ artigos que Jaime d’ Abreu escreveu e publicou no Povo de Vieira, desde o seu primeiro número, quér pelos seus antecedentes pessoais e políticos: antecedentes de homem de bem, como chefe de família, cidadão, advogado, jornalista, primeiro administrador e presidente da primeira comissão republicana de Vieira, nos tempos d’ estudante, em Portugal e no Ultramar, como republicano ardente e sincero que sempre foi”.
O advogado de defesa alegou ainda “os serviços prestados pelo réo á República e, especialmente, ao concelho de Vieira”, concluindo pela “necessidade da absolvição de Jaime d’ Abreu”, apoiado em pareceres escritos dos advogados drs. Alexandre Braga e Alves de Sá, dos jornalistas Bento Carqueja, diretor do Comercio do Porto, dr. Alfredo da Cunha, diretor do Diario de Notícias, dr. Abílio Nápoles, diretor do Povo d’ Águeda, e do senador Goulart de Medeiros, tenente coronel d’ artilharia. Todos os pareceres foram no sentido da improcedência da acusação, “por não verem no artigo incriminado frases ofensivas da dignidade dos poderes públicos, muito menos incitamento à rebelião contra eles ou qualquer atentado contra a segurança do Estado”.
Seguiu-se o interrogatório de Jaime d’ Abreu que começou por afirmar desconhecer por que estava acusado, desafiando os juízes a concretizar a acusação, porque assim “facilitariam a sua defesa”. “Sou arguido pelo libelo, d’ incitar ao cometimento do crime do artigo 1º. Da Lei de 30 d’ Abril, quando é certo que o mencionado artigo trata não apenas d’ um crime, mas de seis crimes (…). Qual deles será? – tentativa contra a forma de governo republicano? Ou contra a integridade territorial da Republica Portugueza? Excitação á guerra civil? Atentado contra o presidente da Republica? Contra os ministros? Ou para impedir a deliberação das câmaras legislativas?”
“Não se referindo o artigo incriminado, quér diréta ou indiretamente á mudança da fórma de governo republicano, nem á destuição da integridade do território nacional, muito menos aludindo ao presidente da Republica, aos ministros d’ ela e a qualquér perturbação do livre exercício do poder legislativo, - poderá admitir-se que houvésse o intuito de me acusarem por incitador á guerra civil? É provável, visto que, nesse sentido, fui interrogado no quartel general, á passagem a Coluna em Vieira. – Nesta ultima hipótese, que movimento podia eu ter excitado? – A sublevação projetada em Vieira, na noite de 6 para 7 de Julho? – Seria absurdo, porque o artigo foi publicado a 13, uma semana depois” (…).
“Averiguado que não incitou a revolta alguma, haveria, todavia, no artigo, o intuito de a provocar? – Não, de modo nenhum. – O artigo é, pelo contrário, a condenação formal e categórica da guerra civil” (…). E é por este artigo – todo pás e fraternidade, aconselhando juízo, quando falte coração, e repelindo com horror a guerra civil – que me trazem aqui e me conservam preso ha mais d’ um mês, para responde como rebelde, por incitador a essa mesma guerra civil!”
Segue-se uma análise detalhada do artigo, com Jaime d’ Abreu a recordar o seu passado de “patriota e republicano desde os 18 anos”, concluindo: (…) “sou vítima dos meus próprios correligionários e da Republica, que tanto desejei e para que tanto trabalhei. – Em nome d’ ela fui preso e mudado d’ um quarto para uma enxovia, onde havia apenas um metro quadrado devoluto para mim e dois companheiros”. (…) Em nome d’ ela conservam-me preso e incomunicável dos meus amigos, pessoas de família, filhos e até de minha mulhér, devassando-me a correspondência, lendo-me todas as cartas, os próprios documentos e elementos de defesa, que em toda a parte, onde ha respeito ou piedade por um acusado, são considerados invioláveis”. (…) E, todavia, srs. Juízes, nem as minhas convicções vacilaram um instante, nem eu vos peço benevolência. – Não, não preciso d’ ela. – Só desejo que me façais justiça – justiça d’ homens honrados”.
Seguiu-se a inquirição das testemunhas – todas de defesa, porque a acusação “não ofereceu nenhuma” – que “confirmaram plenamente quanto, em contestação, alegou a defesa, referindo-se ao réo, que sempre conheceram como republicano sincero e entusiasta, nos termos mais honrosos”.
Nos debates, o promotor disse que o réu “não podia duvidar do efeito das suas palavras, escrevendo e publicando o artigo incriminado no próprio teatro dos acontecimentos. Esse artigo constitue, evidentemente, um incitamento á rebelião, pelo ataque feito ás instituições republicanas (…)”. E o promotor concluiu pedindo a costumada justiça.
Por sua vez, o advogado de defesa reiterou que não havia “qualquer ofensa no artigo aos poderes públicos ou instituições republicanas” e que “falta absolutamente base para incriminar o réo”, conforme os pareceres apresentados e a prova testemunhal produzida em audiência de julgamento. Terminou pedindo a absolvição do réu.
Elaborados e lidos os quesitos, o júri retirou para conferenciar, tendo o Tribunal de Guerra proferido uma sentença, a qual, não sendo unânime, acabou por ditar a condenação de Jaime d’ Abreu na pena de 18 meses de prisão correccional, levando em conta a prisão já sofrida, e em seis meses de multa à razão de 100 réis por dia”.
Na sequência da condenação, Jaime d’ Abreu recorreu, primeiro para o comandante da coluna, pedindo a anulação do processo ou da sentença – a qual foi indeferida sem qualquer fundamento; e depois para o Supremo Tribunal de Justiça, através de um requerimento que foi igualmente indeferido.
Jaime d’ Abreu fez ainda uma exposição ao Presidente da República que o indultou da pena ainda por expiar.
Em apenso, o livro inclui “as explicações de Jaime d’ Abreu perante a autoridade militar que foram publicadas no suplemento ao nº. 37 do Povo de Vieira; as apreciações da Imprensa ao julgamento e respectiva decisão, nomeadamente dos jornais Primeiro de Janeiro, Comércio do Porto, Diário de Notícias, Século, Jornal de Notícias, Povo d’ Águeda, A Nação, Maria da Fonte, Alvorada e Folha da Manhã; os pareceres dos advogados Alexandre Braga e Alves de Sá, dos jornalistas Bento Carqueja, Alfredo da Cunha, Abílio Nápoles, Manuel Goulart de Medeiros; e, por último, o parecer da comissão que se pronunciou a favor da clemência presidencial.
Nome completo do autor da ficha bibliográfica: Manuel da Conceição Cardoso Neto
E-mail: mneto2006@gmail.com