Gonçalves, J. (1972b)

GONÇALVES, José Júlio (1972). Os Meios de Comunicação Social à Luz da Sociologia.

Autor: GONÇALVES, José Júlio

Ano de publicação/impressão: 1972

Título completo da obra: Os Meios de Comunicação Social à Luz da Sociologia

Tema PRINCIPAL: Teoria do Jornalismo

Local de edição: Lisboa

Editora: Academia Internacional da Cultura Portuguesa

Número de páginas: 38 (começa na página 63)

Cota na Biblioteca Nacional e noutras bibliotecas públicas

Cota na Biblioteca Nacional: S.A. 41872 V.

Cota na Biblioteca Pública Municipal do Porto: A7-8-64-23

Índice da obra

[Não tem índice]

Cap. 1-Estruturas sócio-culturais e sistemas comunicacionais ————————–63

Cap. 2-Sistemas e subsistemas de comunicação social coexistentes nas sociedades plurais-65

Cap. 3-Influencia vertical e horizontal dos modernos meios de comunicação nas sociedades pluriétnicas- 69

Cap. 4-Meios de comunicação social, instituições e grupos sociais——————————71

Cap. 5 -Os Meios de comunicação social e as estruturas familiares coexistentes nas sociedades plurais—72

Cap.6 -Intervenção dos Meios de comunicação social no processo de socialização. Aceleração da aprendizagem social—74

Cap. 7 -Acção modificadora dos Meios de comunicação social nos processos sociais———–76

Cap. 8 -Meios de comunicação social, mobilidade social e processo +mudança——————77

Cap. 9-Propaganda, contra propaganda, opinião publica, e efeito de “feedback” ————-79

Cap. 10 -Os Meios de comunicação social ao serviço das culturas doadoras———————-83

Cap. 11-Meios de comunicação da massa, gostos e preferências dos leitores, Radiouvintes, espectadores e telespectadores.

Dissonâncias e vedatizaçao—————————————————————-92

Cap. 12-Metas sociais, modelos sociais, Estereótipos e heróis fílmicos propostos pelos meios de comunicação social–94

Cap. 13 -Noticiários, Reportagens e possíveis efeitos “boomerang” —————————–97

Cap. 14-Um compreensível e “quase-abuso informativo” chamado publicidade—————–100

Resumo da obra (linhas mestras)

O presente livro, da autoria de José Júlio Gonçalves, propõe uma análise sociológica, em termos genéricos ou recorrendo a um exame da realidade empírica, aos problemas (étnicos/multiculturais) inerentes aos meios de comunicação social. Retrata, em especial, múltiplos problemas que podem surgir devido a uma comunicação intercultural deficiente.

Segundo o autor, há três tipos de sociedades: modernas, tradicionais (também designadas primitivas ou arcaicas) e pluralistas ou plurais. Uma sociedade pluralista resulta da interacção entre as duas primeiras, conjugando características de ambas mas caminhando no sentido de se transformar numa sociedade moderna. A sociedade tradicional é heterogénea, apresenta imobilismo tecnológico e resistência à mudança e solidariedade de tipo tribal. Evolui lentamente. A “moderna”, caracterizada pela “europeidade”, é homogénea e culturalmente coesa e não apresenta entraves à mudança. A sociedade tradicional estaria em “processo de desagregação” (p. 63); a moderna, de figurino ocidental, estaria em expansão (p. 63).

Na perspectiva de José Júlio Gonçalves, o crescente contacto das sociedades tradicionais com as modernas leva a mais rápidas transformações nas primeiras. Os media são, segundo o autor, uma peça chave nesse fenómeno: “as populações ainda tribalizadas, com o advento da televisão completarão o salto iniciado com a imprensa, o cinema e a radiodifusão sonora, de um sistema de comunicação de base marcadamente biológico-mecânico para, sem completo desaparecimento deste, um outro caracterizado pelo recurso a meios de comunicação de massa convenientemente estruturados e pelo aparecimento de novos líderes formais e informais, em que estes últimos tenderão a ceder o passo àqueles.” (p. 66)

Para José Júlio Gonçalves, quando “dois ou mais sistemas de comunicação se põem em contacto, o mais avançado tecnologicamente (…) acaba (…) por exercer uma espécie de dominância que produz uma série de efeitos sociológicos que vão desde a concessão e alteração de status até à modificação dos padrões de credibilidade e das pautas sociais, morais ou religiosas, etc., aproximando a cidade do campo, a riqueza da pobreza e, naturalmente, a própria sociedade moderna da sociedade tribal” (p. 66). A isto acresce que “Em geral, os mass media acumulam-se nas zonas citadinas, permitindo a formação, ali, de uma elite de proximidade, sem que o mesmo aconteça nas áreas rurais, não obstante estas constituírem verdadeiras reservas de valores que os meios de comunicação não revelam com a frequência com que o fazem em relação a quem está mais próximo.” (pp. 66-67). Os valores das sociedades tradicionais, difundidos pelos respectivos sistemas comunicativos (simples, assentes em meios bio-mecânicos), mesmo quando arcaicos, funcionam, porém, explicita o autor, como travões aos processos de socialização e aculturação promovidos pelos media tecnologicamente avançados (sistemas comunicativos complexos) próprios das sociedades modernas. Mesmo assim, defende o autor, devido à acção dos media modernos sobre as sociedades tradicionais notam-se nestas últimas alterações nos estilos de vida, nas hierarquias sociais, nas relações entre as pessoas, nos padrões de conduta e, em suma, nas mentalidades. Mais do que isso, a imposição de sistemas mediáticos modernos às sociedades tradicionais põem o domínio sobre os sistemas comunicativos nas mãos de profissionais, quando antes estava nas mãos dos líderes tradicionais.

Segundo José Júlio Gonçalves, as mensagens geram efeitos verticais (entre indivíduos de classe social diferente) e horizontais (entre indivíduos da mesma classe). No entanto, de acordo com o autor, quanto mais complexo e mutável é um sistema social, mais complexos e difíceis de detectar são os efeitos da comunicação social. Para ele, nas sociedades africanas, cada vez mais plurais (no sentido de misturarem traços modernos com traços arcaicos), é também cada vez mais difícil detectar e prever os efeitos dos media, até porque nelas o sistema comunicativo moderno coexiste com o sistema comunicativo tradicional. Contudo, o autor admite a existência de fenómenos de resistência cultural aos valores, modos de vida e atitudes propostos pelos media modernos, que inclusivamente seriam mais fortes nas sociedades plurais, que ainda mantêm sistemas comunicativos tradicionais paralelos aos modernos, do que nas sociedades modernas, marcadas pela complexidade e mudança.

No ponto 4 da obra, o autor perfilha várias teses do interaccionismo simbólico. Para ele, as instituições e grupos sociais são as mais básicas estruturas que se formam entre indivíduos para a satisfação das mais básicas necessidades. Comunicar, neste contexto, é indispensável. Essas instituições e grupos são responsáveis pela atribuição dos papéis e estatutos sociais que são fundamentais para a estabilidade e harmonia da sociedade. Estes papéis são, no entanto, afectados pela comunicação. José Júlio Gonçalves afirma, nomeadamente, que os media têm contribuído para a ocorrência de mudanças nas instituições e grupos sociais, ao nível das posições, status, papéis sociais, relacionamentos, comportamentos, sentimentos de vinculação, identificação e participação, algo que se compreende porque as instituições se estruturam ao redor de “padrões, papéis e relações que os indivíduos realizam segundo determinadas formas sancionadas e unificadas com o objectivo de satisfazer necessidades sociais básicas e que os grupos são conjuntos de pessoas em interacção e comunicação obedecendo a normas, valores e interesses para concretizarem certos objectivos” (p. 71). No contexto africano, que o autor tem presente, “os meios de comunicação (…) contribuem para acelerar o processo de destribalização” ao acelerarem os contractos entre sociedades, ao proporem novas formas de encarar o mundo e de agir e ao facultarem processos de aprendizagem social alternativos aos tradicionais (p. 72). Um efeito semelhante, aliás, segundo o autor, ocorre em torno das famílias, que estariam, segundo José Júlio Gonçalves, em plena transformação, quer nas sociedades plurais, quer nas modernas, pesem embora os fenómenos de resistência à mudança. “Começa a não se poder ler o presente e menos ainda o futuro dos jovens no passado de seus pais”, salienta (p. 76). As mensagens mediáticas podem, aliás, contribuir para conflitos entre gerações, explica o autor.

Os meios audiovisuais, em particular a televisão, são, para José Júlio Gonçalves, os mais influente nas mudanças sociais e nos processos de mobilidade social, gerando mudanças de padrões comportamentais e promovendo a uniformização de padrões culturais. Ele admite mesmo que a escalada social anda intimamente ligada aos graus de informação e de conhecimentos de cada indivíduo, condicionados pelos meios a que acede. Por outro lado, os líderes tradicionais podem-se ver substituídos por líderes revelados pelos media, pois estes são mecanismos de vedetização e revelação de líderes. Os trabalhadores dos media, de acordo com Gonçalves, também aumentam o seu prestígio social, assegurando a sua própria mobilidade social ascendente. Em consequência, as sociedades tribais, prevê o autor, verão o seu sistema hierárquico antigo desaparecer, dando lugar a um sistema de modelo europeu.

No capítulo seguinte, o autor tenta demonstrar que é através dos media que circula e é vinculada a propaganda e contrapropaganda, com vista à manipulação da opinião pública, especialmente de pessoas alheadas da vida politica, que não procuram, ou não têm acesso, aos melhores e mais diversificados meios de comunicação. No entanto, o autor reconhece que as mensagens veiculadas pelos media estão sujeitas a diferentes interpretações e a diversos níveis de aceitação, consoante as crenças, religião valores etc. dos receptores. Em certas situações, o autor admite mesmo a ocorrência do efeito boomerang: as mensagens não só não são aceites como originam efeitos contrários aos pretendidos, voltando-se contra o emissor. Por exemplo, procedimentos que na Europa se consideram correctos, fora dela mostram-se, por vezes, errados.

Mais à frente, encarando os meios, em particular a televisão e a rádio, como “veículos de informação e (…) instrumentos de cultura” (p. 83), o autor atribui-lhes grandes responsabilidades e necessidade de sentido ético na selecção da informação transmitida, pois conseguem afectar os valores fundamentais e geram mudanças de mentalidade. Estes aspectos estão intimamente ligados à problemática da doação cultural (mas também da propaganda e contrapropaganda), pois, segundo o autor, há culturas doadoras e culturas recebedoras. Aqui estão em causa a aceitação ou recusa de valores, crenças, atitudes, comportamentos, etc.

Questionando-se sobre a influência da comunicação social sobre a segurança interna e externa de um país, o autor relembra que um variado número de informações veiculado pelos media pode ser usado pelos adversários desse país em seu próprio proveito, para além de os meios poderem ser usados como veículos de propaganda e contrapropaganda. Aliás, relembra José Júlio Gonçalves, “o poder virtual de uma falsa notícia é sensivelmente o mesmo do que uma notícia verídica.” (p. 88). Por outro lado, quando um órgão jornalístico se vê compelido pelas autoridades a emitir desmentidos frequentes cai no descrédito: “O desmentido (…) pode fazer-se indirectamente. Deixa-se ao público o entendimento da comunicação não-directa sobre a notícia ou boato e evita-se, por vezes, que a dúvida e a desconfiança se ampliem. O desmentido directo alarga a audiência e faz desconfiar. (…) Desmentir e rectificar notícias são, pois, tarefas que requerem certos cuidados” (p. 87).

A partir desse ponto, o autor aborda a questão da objectividade jornalística, reconhecendo que não é possível dar “informação pura”, nem sequer nos meios audiovisuais, mas que é possível pugnar por uma “informação objectiva” que cubra “sectores significativos do assunto, embora mesmo esta deva, na sua óptica, ser “limitada por valores essenciais”, para não conflituar com “os pilares da nossa existência”, pois “objectividade não é sinónimo de verdade” (p. 88 e 90). De qualquer maneira, o autor reconhece ao receptor uma lata liberdade interpretativa e de aceitação ou rejeição das mensagens, embora temperada pelo grau de sugestibilidade destas últimas, em função de factores como a educação, a cultura, a religião, a ideologia, a localização geográfica, o sexo, a ocupação, a capacidade, etc.

Prosseguindo a sua análise sociológica dos meios de comunicação, o autor do livro refere que, tendencialmente, os media escrevem/dizem o que as pessoas querem ouvir/ler, para captar audiências. Os programas televisivos e radiofónicos, as páginas dos jornais e revistas, ressentem-se, de acordo com José Júlio Gonçalves, da “mediocridade do gosto popular”, dominante (p. 92).

No que respeita ao jornalismo propriamente dito, o autor relembra a “dissonância resultante de algumas notícias e reportagens (…) serem incompatíveis umas com as outras” e o facto de “nos telejornais a imagem desmentir, por vezes, a palavra ou esta aquela” (pp. 92-93). Aliás, salienta: “Este mesmo fenómeno ocorre (…) devido à variedade de meios e suas ideologias, orientações, deficiências, etc., ou, noutra perspectiva, devido a distorções, localizações intencionais ou não das notícias, choque de informações, qual wagon effect, etc.” (p. 93). E prossegue: “Quando a dissonância ocorre ou a orquestração fica à vista, há tendência para a neutralizar, para reduzir tal dissonância. É uma tentação que envolve o risco de efeito boomerang” (p. 93), pelo que, inclusivamente, diz o autor, há quem procure reduzir a dissonância de forma implícita e não explícita, recorrendo, por exemplo, não a um desmentido, mas sim a uma nova notícia que passe uma mensagem contrária à que se quer desmentir.

O autor recorda, finalmente, que os meios propõem modelos sociais e passam frequentemente estereótipos. Ora, se “noticiar e fazer reportagem são duas funções primordiais dos meios de comunicação social” (p. 97), então torna-se necessário que os jornalistas tenham uma profunda preparação, incluindo uma boa formação etnológica, para não cometerem erros graves nem gerarem efeitos de boomerang. Um vocábulo usado sem problemas na Europa, por exemplo, pode ferir susceptibilidades em África, relembra. Contudo, José Júlio Gonçalves, sem desculpabilizar os erros jornalísticos, também reconhece que “recolher, verificar, seleccionar informações para fazer notícias, elaborar um telejornal, etc. não é tarefa fácil” (p. 98).

Nome completo do autor da ficha bibliográfica: Tiago João Valente Alves/Jorge Pedro Sousa

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