Andrade, Adolfo (1937)

ANDRADE, Adolfo (1937). Dos Jornais.

Autor: ANDRADE, Adolfo

Ano de elaboração (caso não coincida com ano de publicação)

Ano de publicação/impressão: 1937

Título completo da obra: Dos Jornais

Tema principal: História do Jornalismo

Local de edição: Lisboa

Editora (ou tipografia, caso não exista editora): Rotary Club de Lisboa

Número de páginas: 12

Cota na Biblioteca Nacional e eventualmente noutras bibliotecas públicas

Biblioteca: Biblioteca Nacional Cotas: L.30873

Biblioteca: Biblioteca Pública Municipal do Porto

Cotas: Q1-9-46

Esboço biográfico sobre o autor ou autores (nascimento, morte, profissão, etc.)

Adolfo Andrade foi presidente do Conselho de Administração da Empresa Nacional de Publicidade, proprietária do Diário de Notícias e presidente do Grémio Nacional da Imprensa Diária.

Índice da obra

P.

O jornal – as “Acta Diurna” – Gazeta ……………………………………………………………………………………………………………………………………1-3

Datas de aparecimento dos jornais nalguns países ………………………………………………………………………………………………………………………. 3

Os primeiros jornais de França …………………………………………………………………………………………………………………………………….…… 3-4

Os primeiros jornais de Inglaterra …………………………………………………………………………………………………………………………………….….4-5

Os primeiros jornais de Portugal …………………………………………………………………………………………………………………………………………5-8

O produto inglês, americano e francês ……………………………………………………………………………………………………………………………………8-9

A importância da imprensa na sociedade ……………………………………………………………………………………………………………….………………..9-10

A missão social de cada jornalista ………………………………………………………………………………………………………………………………………..10-12

Resumo da obra (linhas mestras)

Esta obra recupera uma palestra sobre história do jornalismo proferida, em 1937, no Rotary Clube de Lisboa, por Adolfo Andrade, à época presidente da mais importante empresa jornalística portuguesa, a Empresa Nacional de Publicidade, proprietária do Diário de Notícias.

Adolfo Andrade começa por falar na publicação das “Acta”, que, segundo ele, era feita quotidianamente a partir da ditadura de Júlio César, mas que, com a queda do Império Romano, desaparece. Para ele, as “Actas Diurna” foram um “embrião de jornalismo”, conforme a classificação que delas deu o jornalista, historiador e polígrafo Manuel Pinheiro Chagas.

As Actas, para ele, foram uma manifestação e necessidade da vida social, mas perderam-se os seus vestígios durante a idade Média, devido aos bárbaros, que após a conquista, não conservaram entre si qualquer traço de civilização. O autor relembra, ainda, que só nos princípios do século XVII, passados mais de 150 anos sobre a invenção de Gutenberg, é que apareceu algo que se pode considerar um jornal.

Apareceram por essa época na Republica Veneziana as primeiras folhas impressas, relatando acontecimentos internos ou externos, como batalhas, catástrofes, questões comerciais, etc. Eram vendidas a troco de uma pequena moeda chamada “gazeta”, o qual de nome da moeda indicativa do preço, passou a confundir-se com o da publicação, surgindo assim a denominação “Gazeta”.

As notícias das gazetas circulavam livremente, ao contrário das “fogli d’avissi” ou “foglietti”, em que o senado de Veneza redigia as questões importantes do Estado, enviando-as aos seus agentes diplomáticos para os esclarecer nas negociações internacionais, sendo naturalmente secretas, como convinha a instrumentos diplomáticos.

O autor recorda que no jornalismo a China precedeu a Europa, pois aí existiu durante mais de um milénio um jornal impresso em papel de seda.

Adolfo Andrade evoca, depois, as datas em que apareceram os primeiros jornais nalguns países da Europa: Alemanha, em 1590; Bélgica, em 1605; Inglaterra, em 1622; Holanda, em 1623; Espanha, em 1626; França, em 1631; Itália, em 1635; Portugal, em 1641; Suécia, em 1648; Dinamarca, em 1663; Rússia, em 1703; Hungria, em 1721; Noruega, em 1763; Turquia, em 1795 e Grécia, em 1811.

A 30 de Maio de 1631, diz Adolfo Andrade, saiu em Paris o primeiro número da “Gazette de France”. Foi, segundo ele, o primeiro jornal político conhecido, de marcada influencia nos reinados de Luíz XIII e de Luíz XIV.

O autor salienta que, apesar de terem aparecido em vários países (e entre eles Portugal), alguns anos antes, certas publicações com algumas características de jornal, a verdade é que, desde o primeiro dia da sua publicação, a “Gazette de France”, correspondeu, como nenhum outro, à ideia que hoje fazemos do jornal, não só pela regularidade na sua publicação, mas ainda pela abundância e escolha dos assuntos, superioridade da sua redacção e número de correspondentes espalhados pela Europa.

A “Gazette” chegou a deter, como privilégio do Estado francês, o monopólio da imprensa política e industrial e a publicação de anúncios, como, a seguir, o “Journal dês Savants” deteve o exclusivo da imprensa literária e científica.

Também desempenhou um papel importante na história da literatura francesa do século XVIII o “Mercúrio”, mais tarde “Mercúrio de França”. Fundado pelo dramaturgo Donneau de Vise, o “Mercúrio” trouxe, entre outras inovações, uma interessantíssima: o folhetim – delicioso manjar, que tantos leitores, e mais ainda, leitoras, conquistou para os jornais, em gerações sucessivas.

Em Inglaterra, em 1702, é interessante registar, segundo Andrade, o aparecimento do jornal quotidiano impresso, com o título “Daily Courant”. Os seus fundadores adoptaram para este jornal um formato correspondente a metade do usual para, segundo explicavam, “pouparem ao público pelo menos metade das impertinências que continham os jornais ordinários”. Resta saber, comenta Hain, citado pelo autor, se não seria antes para se pouparem os fundadores do “Daily Courant” a metade do trabalho que teriam em preencher dia a dia um jornal do formato habitual.

Certo é, porém, que a vitória da Inglaterra na precedência do jornal quotidiano é manifesta, retumbante.

Basta dizer que só 75 anos após o aparecimento do diário inglês surgiu o primeiro diário francês, o “Journal de Paris”.

Seguidamente, o autor coloca várias questões relacionadas com a introdução do jornalismo em Portugal, às quais responde.

Qual é o mais antigo periódico português?

A maioria dos bibliográficos portugueses consideram como sendo o mais antigo jornal português a “Gazeta em que se relatam as novas todas que ouve n’esta corte e que vieram de várias partes no mês de Novembro de 1641” – também conhecida por “Gazeta da Restauração”.

Segue-se-lhe o “Mercúrio Portuguez” com as novas de Portugal e Castela, de 1663.

Basta ler a primeira folha de cada uma desta publicações, para se verificar a flagrante evolução de processos jornalísticos operada entre uma e outra:

1ª Pagina da “Gazeta”

“Pelejou a armada de Olanda com huma esquadra da armada real de Castella, em que vinhão muitas fragatas de Duquerque: durou a pendência mais de vinte, & quatro oras; foise a pique hum galeão dos Castelhanos, & ficarão alguns destroçados, & todos com muita gente morta. O Olandez com algum dano se retirou a este porto, donde está guardando a que elRey nosso Senhor lhe de socorro para sair outra vez a atemorizar os portos de Andaluzia.

O Conde de Castanheira, que estava preso numa torre de Setuval pedio a elRey nosso Senhor usando de sua natural benignidade o mãdou trazer para o castello de Lisboa.

Num lugar da Beira se afirma que ouve hum ome, que ouvindo dizer numa cõversação de amigos que na felice aclamação delRey nosso Senhor, fizera o crucifixo da Sé o milagre que a todos he notório disse que podia acaso a imagem do Senhor despregar o braço; & assim como acabou de dizer estas palavras cahio huma parede junto da qual estavão todos da conversação, & só a elle matou.”

1ª Página do “Mercúrio Portuguez”

Novas do mez de Janeiro de 1663

“Saber os successos de outros Reynos, & Províncias, não he só curiosidade, mas necessidade aos Políticos; porque de mais do que se aprende pelos exeplos (que sendo do mesmo tepo, são melhores mestres) o estado em que se achão os outros, principalmente se são vesinhos, ou interessados, he medida per que se regulao, & encaminhão os meios da conversação, & utilidade própria.

Este serviço puderão fazer ao bem commum os Castelhanos melhor que os Portugueses, porque os seus ingenhos sempre se aplicárão mais a escrever como os Portuguzes só a obrar o que deo matéria aos Scriptores mais insignes.

Porém, ou pouco informados, ou muito ligeiros, ou com demasiada paixão, referem as cousas tão erradamente, que fica a relação sem alma, que he a verdade, &sua lição muito prejudicial a quem lhe dá credito, & o peor he, que não sei por que fatilidade, o tem com os estrangeiros tão grande, que na opinião mais que nas forças os atemorisa Castella.”

Como facilmente se pode verificar, segundo Adolfo Andrade, ao passo que na “Gazeta” se apresentava ao leitor um feixe de notícias variadas, despidas de qualquer comentário e sem arrumações de assuntos, o “Mercúrio” abre com um artigo doutrinário, em tudo semelhante aos modernos editoriais ou artigos de fundo.

Para o autor, é interessante notar, também, as características dominantes da Imprensa de Londres, Nova York e Paris, sintetizadas com notável imparcialidade e superior espírito de observação, por um dos mais brilhantes jornalistas franceses, Stéphane Lausanne, no seu curioso livro “Sa Majesté La Presse”. O produto inglês, segundo Lausanne, citado por Andrade, é sério, consciencioso, bem trabalhado, mas fica quase sempre exclusivamente inglês. Falta-lhe leveza e objectividade. Não foi manufacturado e não é entregue ao público senão com o objectivo de servir o interesse inglês. O produto americano é muito mais objectivo e imparcial. Aqueles que o trabalham preocupam-se principalmente em conseguir agradar ou divertir o publico. Não descuram para isso nenhum esforço, nenhum sacrifício, nenhum estratagema. Não têm, de resto, qualquer ideia preconcebida. Não têm grandes paixões, nem grandes ódios, nem mesmo grande opinião. Só fazem questão duma coisa: contar uma boa história. Quanto ao produto francês, é um produto essencialmente individual: todavia há 25anos vem sofrendo a influencia do produto americano. E, depois de afirmar quanto a imprensa francesa era pesada e indigesta com o seu individualismo extremo, Lausanne, citado mais uma vez por Andrade, acrescenta: “ vejamos agora o moderno jornal francês; surpreende-nos com a quantidade de notícias e a variedade de assuntos que trata. O editorial é, as mais das vezes, de carácter instrutivo e documentário. Numerosos os telegramas dos enviados especiais dispersos pelo mundo. Abundantes as entrevistas sobre os mais variados assuntos. Atraentes as fotogravuras, permitindo focar num momento uma cena ou uma fisionomia. Há nele ar, vida, luz. E isso, a imprensa francesa deve-o à americana. Deve-lhe a característica mais notável da nossa época: o gosto pela notícia.

De acordo com Andrade, “a imprensa representa indiscutivelmente uma força, uma força enorme, talvez mesmo a maior de todas, porque sem ela, ou contra ela, não há instituição que perdure, não há ideia que se arreigue, não há iniciativa que frutifique. Mas, porque essa força é poderosa, é que ela exerce com toda a prudência, superior critério, imparcialidade e justiça, tendo como “último”, sempre o interesse público, o bem comum”. Para ele, mais do que nunca, no momento “tormentoso” que o país atravessava em 1937, a imprensa deveria ser “nacionalista, no sentido de concorrer, tanto quanto possível, para o engrandecimento da Pátria”. Segundo o autor, fugindo a essas normas, a imprensa trai a sua missão, transformando-se em arma perigosa. Da sua actividade podem resultar as consequências mais fatais.

Para o autor, cada jornalista “tem uma missão social a cumprir”. E continua:

“Deve exercê-la honesta, lealmente, sob pena de comprometer junto da opinião pública o jornal que serve. Errar é humano. Por isso o jornalista, que é feito da mesma massa dos restantes mortais, uma ou outra vez pode errar. Mas esse erro não é em regra determinado por um propósito, por maldade, ou por má fé. Antes resulta, geralmente, das condições especiais em que por vezes é forçado a trabalhar. Motivo de justificado orgulho é o reconhecimento das qualidades excepcionais do jornalista português. É ver com quanta abnegação e espírito de sacrifício parte, no momento oportuno, para as missões mais arriscadas, não se poupando a esforço de nenhuma ordem, a fim de pôr o seu jornal em condições de melhores e mais sensacionais informações ao público!”

Apesar de tudo, salienta o autor, as empresas jornalísticas e os profissionais de imprensa “são alvo, a cada passo, de censuras e criticas, quase sempre imerecidas, quando não profundamente injustas. Não se dão conta, geralmente, esses críticos, do que seja o trabalho febril numa redacção dum jornal importante, especialmente, à última hora, nos breves momentos que precedem o início da sua impressão. E que, em cada 24 horas, com enormes sacrifícios financeiros das empresas e com um esforço pessoal notável dos trabalhadores de imprensa, o jornal tem que sair, completo em todas as suas secções, sem omitir seja o que for que, interna ou externamente, possa interessar ao público conhecer. Que só o trabalho de composição dum numero de jornal, como o “Diário de Notícias”, daria normalmente para encher em cada dia um livro de formato vulgar com mais de trezentas paginas. E tudo isto tem de ser feito maquinalmente (…), para evitar o atraso na saída do jornal, as perdas de comboios e outros incidentes desastrosos, cujas consequências se reflectem em prejuízos morais e materiais valiosíssimos.”

Adolfo Andrade termina a sua palestra com as palavras do jornalista Norberto Lopes num artigo intitulado “Ingrata Profissão”, publicado no “Diário de Lisboa” sobre a profissão de jornalista e que ele generalizou à imprensa portuguesa, e de modo especial à grande imprensa, que, “realizando um esforço enorme, cumpre elegante, honesta e nobremente a sua missão”:

“Se o leitor soubesse, se o leitor tivesse a generosidade de compreender, quantas faltas lhes seriam perdoadas, quantas omissões involuntárias lhes seriam desculpadas, quantos comentários seriam injustos lhe seriam poupados – e como acabaria por se lhes fazer justiça!”

Autor: Rafaela Peixoto

E-mail: rafaela411@hotmail.com