Ferreira, R. (1945)

FERREIRA, Rafael. (1945). Nos Bastidores do Jornalismo. Memórias de Rafael Ferreira.

Autor: FERREIRA, Rafael

Ano de elaboração (caso não coincida com ano de publicação)

Ano de publicação/impressão: 1945

Título completo da obra: Nos Bastidores do Jornalismo – Memórias de Rafael Ferreira

Tema PRINCIPAL: Jornalistas e Vida Profissional

Local de edição: Lisboa

Editora (ou tipografia, caso não exista editora): Romano Tôrres

Número de páginas: 199

Cota na Biblioteca Nacional e noutras bibliotecas públicas

Cota na Biblioteca Nacional: P. 5862 P.

Cota na Biblioteca Pública Municipal do Porto: S2-4-15

Esboço biográfico sobre o autor ou autores (nascimento, morte, profissão, etc.)

Rafael Ferreira nasceu a 1865 e morreu a 1952 em Lisboa. Exerceu várias funções em diversos jornais. Para além disso, foi romancista, dramaturgo e poeta.

Índice da obra

Conversando: pág. 9

I-Atracção do imprevisto – Disposições para repórter: pág. 13

II-A minha iniciação – O quinzenário «O Monóculo»: pág18

III-Dia de António Enes e Moreira de Almeida: pág29

IV-Silva Graça e Século: pág55

V-Visitas de Chefes de Estado-Nos paços de Sintra, Belém e Ajuda: pág83

VI-Centenários – De Camões a Bocage: pág107

VII-Sob a bandeira brasileira – Reportagens e entrevistas: pág130

VIII-No Jornal do Comércio e das Colónias – Visitas à Batalha, ao Luso e a Coimbra: pág147

IX-Regressando à infância – Aspectos, figuras e episódios: pág165

X-O Correio da Europa e o Comércio do Porto: pág185

Recompensas morais: pág192

Resumo da obra (linhas mestras)

Esta obra é uma autobiografia de um jornalista típico do final do Século XIX e primeira metade do Século XX. É muito útil para a compreensão das transformações que ocorreram no jornalismo português nesse período de expansão da imprensa e está cheia de referências a jornalistas, a jornais, às rotinas produtivas e ao clima “boémio” das salas de redacção de então.

Rafael Ferreira traça o seu perfil de jornalista desde a sua infância, considerando que já nessa época demonstrava vocação para a profissão. Rafael Ferreira atribuiu essa disposição ao gosto pelo imprevisto e à ansiedade pelas surpresas. Isto também justifica o fascínio do autor pelo teatro, revelado nas páginas do livro. Conta ainda o autor que desde novo se interessava por periódicos manuscritos, que só eram fornecidos aos colegas mais velhos. Em troca deles, oferecia objectos escolares. Rafael Ferreira confessa também que quando ia a alguma festa tinha a capacidade da observação e memória suficiente para descrevê-la em pormenor.

Diz Rafael Ferreira que, ainda estudante, inaugurou um quinzenário de nome O Monóculo, juntamente com outro colega. Mas, devido à falta de capital para manter o periódico e às vendas insuficientes tiveram de desistir.

Entretanto, o pai de Rafael Ferreira foi convidado para administrador do jornal Dia e conseguiu-lhe arranjar emprego no mesmo como empregado da administração. Os oito anos que esteve nesse jornal, confessa o autor, foram um período de “grande aprendizagem” com os colegas e superiores (a socialização e aculturação na profissão faziam-se na “tarimba”), em particular com o director do jornal, António Enes, uma pessoa onde “talento, (…) energia, (…) bom senso” se combinavam com “a forma literária (…) numa comunhão ideal”. Para ele, António Enes era, para além disso, uma pessoa justa, amigo do seu amigo, que transmitia grandes valores.

Com o sucessor de Enes na direcção do Dia, Moreira de Almeida, Rafael Ferreira, segundo narra, foi encarregado de grandes reportagens, aquilo de que mais gostava. Pelo contrário, ele refere que, como não se interessava por política, sempre que por falta do jornalista responsável desta área o tinha que substituir sentia-se “desnorteado” e tinha que recorrer, embora “contrafeito”, a colegas de outros jornais. Rafael Ferreira admite, aliás, ter tido bons colegas, com os quais “cresceu enquanto jornalista e membro da sociedade”. Rafael Ferreira termina o seu relato sobre o Dia admitindo “uma tão grande saudade como a que se consagra a um grande bem que se perdeu”.

Do Dia, o autor partiu para o jornal Século, onde, tal como no jornal anterior, teve “bons mestres”. Também no Século se deparou com excelentes colegas e um excelente director, Silva Graça. Rafael Ferreira conta que no director do Século viu qualidades como a sensibilidade, a humildade (de reconhecer a razão nos outros), a simplicidade e generosidade dos seus actos, o amor à Pátria e a solidariedade demonstrada em muitas campanhas, como as de protecção às crianças pobres. Revelando, mais uma vez, que o “tirocínio profissional” se fazia na “tarimba”, Rafael Ferreira salienta que o Século dirigido por Silva Graça era “uma escola dum jornalismo, de actividades e de inteligência, que deu (…) grandes alunos”, alguns dos quais vieram a ser subdirectores do Século e directores de outros periódicos.

Falando sobre as reportagens que fez no Século acerca das visitas de chefes de Estado aos paços de Sintra, Belém e Ajuda, Rafael Ferreira salienta a prestabilidade e a recepção amável do povo português aos estrangeiros. Relembra também com saudade as festas da Tapada de Ajuda, em que a rainha e as mulheres da aristocracia portuguesa vendiam flores em auxílio da sua obra de benemerência, provando a simplicidade e bondade da alta classe portuguesa. Rafael Ferreira sintetiza: “A bondade nativa da gente portuguesa não é apenas uma frase mas sim uma verdade”.

A propósito de comemorações festivas, Rafael Ferreira relembra centenários, desde o de Camões ao de Bocage. Do tricentenário de Camões lembra-se claramente que “foi todo o povo de Lisboa e muitos milhares de forasteiros do país e do estrangeiro que lhe deram extraordinário brilho”. Para ele, desde o cortejo, ao fogo de artifício, à distribuição gratuita de milhares de exemplares duma edição popular dos Lusíadas, aos versos escritos em dedicação ao poeta, a festa foi a “mais entusiástica e patriótica” que se realizou. Após a celebração camoniana, Rafael Ferreira relembra no livro as reportagens que fez sobre os centenários do Marques de Pombal e da Descoberta do Caminho Marítimo para a Índia, mas sem lhes dar a mesma atenção. A comemoração do centenário de Bocage foi descrita com maior interesse, visto Rafael Ferreira ter realizado uma reportagem, na altura, para o jornal Dia, que o encheu de emoção. Como jornalista, visitou o local onde o poeta faleceu e relatou a partir daí a vida deste. Duas outras reportagens para o Século que Rafael Ferreira evoca no livro foram sobre a visita de oficiais da marinha brasileira e da Grécia a Lisboa.

Rafael Ferreira revela que, durante o tempo em que esteve afastado do Dia e do Século, trabalhou em vários jornais da noite e da manhã, onde desempenhou funções como empregado de administração, revisor na Capital, redactor, repórter, crítico teatral no Debate e tauromáquico no Jornal do Comércio e das Colónias. Chegou, diz, a trabalhar em mais que um jornal ao mesmo tempo, descansando e alimentando-se pouco. Um dos jornais por onde passou foi a Vanguarda, do qual se recorda com orgulho e cheio de admiração pelos colegas que teve. Rafael Ferreira conta-nos, também, episódios da sua vida de repórter, nos quais se sentiu bastante embaraçado, pois “essa coisa de entrevistar um leopardo não era reportagem de confiança”. Já no jornal Opinião teve a oportunidade de entrevistar personalidades tão distintas como Manuel de Arriaga e José Relvas.

Para além dos jornais Dia e O Século, Rafael Ferreira também trabalhou no Jornal do Comércio e das Colónias durante dezasseis anos. Diz que pela redacção passaram algumas das figuras mais ilustres do jornalismo e da literatura do nosso país, como Alberto Bessa, que tinha vindo do Século, tal como o autor (a amizade representava, aparentemente, um útil factor de acesso às redacções). Do trabalho no Jornal do Comércio e das Colónias, Ferreira relembra com particular saudade as reportagens das suas visitas à Batalha, ao Luso (inauguração de um monumento ao jornalista Emídio Navarro) e a Coimbra. Desta última viagem relembra de um almoço de confraternização, as visitas aos monumentos da cidade e à Universidade

De outras memórias vive Rafael Ferreira. Regressando à sua infância, conta-nos com simplicidade as procissões imponentes a que assistia com fervor. Faz questão de elucidar os seus leitores que para além dos monárquicos também os republicanos participavam na procissão da Senhora da Saúde. Também das comemorações dos santos populares se lembra com alegria, evocando, por exemplo, os bailes nos quintais. Revela que desde criança adorava a tauromaquia, daí que se explique ter desempenhado o papel de crítico desta arte. Foi influenciado por uma sociedade em que a simplicidade e o espírito de sacrifício predominavam. Tais qualidades verificam-se, explica, no modo humilde que sempre evidenciou para se dirigir a pessoas de estatuto elevado. Da sua infância, relembra Rafael Ferreira, que apesar de ser uma “Época sem progresso e sem a ciência das bombas atómicas, era cheia de pitoresco e mais económica que a de hoje”.

Dos vários jornais por onde passou, Rafael Ferreira sentiu necessidade de, no seu livro, mencionar ainda O Correio da Europa e O Comércio do Porto. Assim, nas páginas do seu livro de memórias sai uma homenagem a Francisco Pastor, dono do Correio da Europa, e ao seu sobrinho. De Francisco Pastor diz ser um homem inteligente, culto e acima de tudo “Corajoso velho, cheio de dignidade e de amor do seu jornal e ao cumprimento do seu dever”. Para comprovar as suas revelações, conta-nos que para manter o seu jornal Francisco Pastor chegou a ir ao Brasil, com o objectivo de cobrar assinaturas em débito. Quanto a Luís Pastor de Macedo, o sobrinho, Rafael Ferreira elogia o seu valor enquanto escritor.

Da passagem pelo Comércio do Porto, Rafael Ferreira conta que desempenhou o papel de informador notícias sobre as colónias, que chegavam mais rápido a Lisboa que ao Porto. Relembra Bento Carqueja, director do jornal, do qual Rafael Ferreira se afirma amigo e que considerava ser “um homem que merecia valor tanto pela sua inteligência como pela sua bondade”. Conta Rafael Ferreira que Bento Carqueja lhe confiou, também, trabalhos de que investigação, os que mais lhe agradavam.

No seu livro de memórias, Rafael Ferreira, em jeito de conclusão, salienta que o jornal de cada jornalista deve ser considerado como a “bandeira, que devemos sempre honrar” e que o seu empenho e amor pessoais à profissão eram reconhecidos quando via que as pessoas se interessam pelo que escrevia.

De recompensas morais, relembra a entrega da Ordem de Cristo ao Sindicato dos Jornalistas, que “uma agradável compensação aos (…) sacrifícios e aos (…) desejos de bem servir” protagonizados pela classe

Rafael Ferreira não podia deixar de relembrar a homenagem proferida à sua pessoa pelos colegas do Século Guilherme Pereira da Rosa e Leopoldo Nunes. Sentindo-se feliz e estimado pelas pessoas que o rodeavam, julgava-se, finalmente, merecedor da tranquilidade, depois de uma vida agitada e por inteiro consagrada ao jornalismo.

Nome completo do autor da ficha bibliográfica: Andreia Susana Afonso Rodrigues

E-mail: andreiasusana8@hotmail.com